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Ana Belchior Melícias

SABER VEM DE SABOR

Chegou-me por mãos amigas, o link da Biblioteca Mundial da ONU – www.wdl.org. Lançada pela Unesco em Abril de 2009, esta dádiva para a humanidade, surpreende-nos logo na página inicial com os seguintes dados: 19.147 ítens sobre 193 países entre 8.000 a.C. e 2000.

Disponível na internet, sem necessidade de registro, permite consultar gratuitamente o acervo de grandes bibliotecas e instituições culturais de inúmeros países. Desenvolvendo o multilinguismo, permite igualmente apreciar e conhecer melhor as diferentes culturas do mundo, nos sete principais idiomas da Unesco: árabe, chinês, inglês, francês, português, russo e espanhol.

Num tempo onde a informação nos afoga em contradições, medos e truques ilusionistas dos jogos de verdade ou mentira, não conseguimos destrinçar o joio do trigo e o tempo e a velocidade não nos permitem o ócio necessário ao pensamento, como bem sabiam os gregos. Seduzidos pelo canto da sereia do neg-ócio da informação e dos media, querendo ou não, em maior ou menor escala, tornamo-nos consumidores armadilhados pelas novas tecnologias: jornais digitais, internet, twitter, facebook, instagram, whatsapp… Tomamos diariamente uma verdadeira overdose de informação, ficando paradoxalmente cada vez mais desinformados e toldados, impossibilitados de pensar.

Abdelaziz Abid, coordenador da Biblioteca da Unesco em parceria com trinta e duas instituições de países como China, Estados Unidos, França, Brasil, Grã-Bretanha, México, Rússia, Arábia Saudita, Egito, Uganda, Israel e Japão, conta que a estrutura foi baseada na Biblioteca do Congresso dos Estados Unidos: “As instituições continuam proprietárias de seu conteúdo cultural.”

Destinada essencialmente a investigadores, professores e alunos, é um legado da máxima importância para as novas gerações que vivem cada vez mais através da tela, num mundo audio-visual. Preparada para receber um número ilimitado de textos, gravações, mapas, fotografias, ilustrações e filmes de todos os tempos, a excelente definição das imagens, permite ler cómoda e detalhadamente, virando as páginas de um livro, aproximando ou afastando textos e imagens com um clique.

Cada elemento da cultura universal aparece acompanhado de uma breve explicação do seu conteúdo e significado. Os documentos foram digitalizados e apresentados no idioma original, junto a explicações nas sete línguas oficiais do site. A busca pode ser filtrada por épocas, zonas geográficas, tipo de documento e instituição.

A surpresa é constante e os exemplos são inúmeros: “Os tesouros incluem códices pré-colombianos; o Hyakumanto Darani, um documento em japonês publicado no ano 764 e considerado o primeiro texto impresso da história; um relato dos astecas que constitui a primeira menção do Menino Jesus no Novo Mundo; trabalhos de cientistas árabes revelando o mistério da álgebra; O Conde de Genji, obra da literatura japonesa do século XI, considerado um dos romances mais antigos do mundo; ossos utilizados como oráculos e esteiras chinesas; a Bíblia de Gutenberg; o primeiro mapa que menciona a América, de 1507, realizado pelo monge alemão Martin Waldseemueller; o jornal de um estudioso veneziano que acompanhou Fernão de Magalhães na sua viagem ao redor do mundo; o original das “Fábulas” de Lafontaine; pinturas rupestres africanas que datam de 8.000 A.C.; a célebre Bíblia do Diabo, do século XIII, da Biblioteca Nacional da Suécia e manuscritos científicos árabes da Biblioteca de Alexandria, no Egito.”

A origem etimológica da palavra saber, vem do latim sabor: sapĭo,is,ŭi,īvi (ou ĭi e ī ) ,ĕre ‘ter sabor, ter bom paladar, ter cheiro, sentir por meio do gosto, ter inteligência, ser sensato, conhecer, compreender, saber’. Nestes tempos de turbulência global e confinamentos claustrofóbicos, sugiro um amplo passeio pelo saber-saboroso de mundos e eras longínquas. Através da sensorialidade estética, tocamos de perto a dimensão estética do conhecimento, da criatividade e espantamo-nos com a imensidão do potencial civilizatório.

Imagem: “Livro das constelações das estrelas fixas” de Abd al-Rahman ibn Umar al-Sufi (903–86)

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