A obra de Freud mostra-nos uma ligação indissociável entre a sexualidade e a moralidade. A eliminação de uma levando ao desaparecimento da outra.
Para Adorno, filósofo e teórico da Estética, a barbárie é o literal. Diferentemente da pornografia, literal por natureza, a arte por força da sua pura legalidade não pode atingir este patamar sob pena de, dessa forma, se suprimir a si mesma. Neste sentido, ela não pode ser totalmente objectivada e não é, por isso, um simples factum.
O impulso para a humanidade decorre, assim, de um acto de violência para com a natureza. A arte, como artefacto, contrapõe-se pela sua aparência ao não fabricado, antítese conseguida pelo recalcamento do natural. Através deste procedimento assegura o homem a sua dignidade enquanto homem dotado de moral e legitimidade para avaliar as suas produções em termos de verdade, beleza e bondade.
Nietzsche refere, por exemplo, que a sensualidade do espectador começa, muito provavelmente, quando acaba a do artista. Isto quer dizer que, quando o artista tenta nas suas obras suscitar no espectador as suas pulsões primárias, não conseguirá fazê-lo de forma explícita, porque em arte este processo acontece através da sublimação e não de forma directa.
O poder artístico não tem já necessidade de nenhuma prova; desdenha o agradar; dificilmente dá uma resposta; não sente testemunhas em seu redor; vive sem ter consciência de que existam críticas contra ele; repousa em si, fatalista, uma lei entre leis. Isto é para Nietzsche aquilo que distingue um estilo verdadeiramente artístico.
De que teremos medo quando nos confrontamos ao lado, e não a norte, com esta exposição no Museu de Serralves? E nos confrontamos, imarcescíveis, com uma polémica vitoriana?
Teremos medo de acordar a besta que em nós dorme? Como corda estendida sobre o abismo existe, necessariamente, na humanidade, um equilíbrio instável entre o “anjo” e a “besta”, ou seja, um princípio contraditório da existência, que a torna trágica.
A bela tentação da alma para a consciência moral, para o angélico, resvala assim para a ilusão da presunção. Para uma lei do coração que, como nos mostra o psicanalista André Green, tem como referência a paranoia. Isto é, a auto-consciência retirada de toda a externalidade, condenada ao delírio e à mentira, colapsando em si própria. Isto é, a preocupação com a ordem do mundo, o desejo de mudá-la mas com o anseio da virtude, de amassar a massa de que é feito o homem, enquanto se esforça simultaneamente por manter as suas mãos limpas.
Adorno, o mestre da Escola de Frankfurt, lembra-nos que a esfera do sagrado é, por assim dizer, objectivada, murada, porque o seu momento de falsidade aguarda tanto a secularização, como dela se defende mediante o exorcismo. Assim, o puro conceito de arte não constituiria o círculo de um domínio garantido de uma vez por todas, mas só se produziria de cada vez, em equilíbrio momentâneo e frágil, muito comparável ao equilíbrio psicológico do Ego e do Id. O processo de repulsa deve continuamente renovar-se.
Crédito da imagem : Self Portrait , 1983, (c) Robert Mapplethorpe Foundation. Uso não comercial.
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