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Henriqueta Martins

Covid 19 – Regresso à creche

No dia 18 de Maio de 2020 só 25% das crianças regressaram à creche. A maioria dos pais teve medo de trazer os filhos. Algumas crianças que vieram pareciam regredidas, outras pareciam reconfortadas por poder sair de casa e voltar a um espaço de brincar. As educadoras receberam-nas com abraços, apesar das máscaras. 

Impressiona como as crianças mostram uma capacidade tão grande de adaptação!

Depois de dois meses de confinamento, se os bebés pudessem falar…diriam:

Não percebo nada do que se passa, achei que ia ficar com a mamã para sempre, que já não seria abandonado…

Por momentos foi tão bom ficar em casa!

Às vezes era só eu e a mãe, às vezes o pai também estava. Em certos momentos havia qualquer coisa, a mãe parecia assustada, não queria brincar comigo e o pai também não. Não sei se era porque eu tinha estragado a minha roca, se foi porque sujei o chão…ela limpava, limpava, só queria ver televisão. O papá ia saindo, vestido com uma máscara e com luvas… (com aquilo na cara não me poderia comer!). Não percebi porque é que não podíamos ir ao jardim, nem aos avós…nunca mais brinquei com outros meninos. Por mais birras que fizesse mais irritados os pais ficavam…então eu pensava: estão tão inquietos, lá fora deve haver uma coisa assustadora! Quando finalmente fomos à rua fiquei muito excitado, a mãe tapou a cara, será que ela estava com medo?

Chegámos à creche.

Oh, não! Vai-me deixar outra vez.

Porque é que ela está triste, será que eu fui mau?

Está ali a Joana, a minha educadora, também está com a boca tapada! Será que também está com medo como a mamã?… Parece que não, deu-me cá um abraço!…Tem o mesmo perfume e falou-me com aquele tom carinhoso… a Mariazinha também já cá está e quer brincar comigo, o Gonçalo continua a tirar-me os brinquedos…Eu e a Maria passeámos os “bebés” no jardim, brincámos à apanhada…Corremos tanto!…

Já são horas de almoço?…Não me apetece comer sozinho. Vou esperar, não como e assim talvez alguém me ajude.

Nestes dois meses talvez as crianças não tenham perdido nada. Afinal, quando regridem, as suas aquisições anteriores continuam no seu interior. A necessidade e o desejo neste momento particular é de serem compreendidas, tocadas e contidas nos seus mal-estares e inquietudes face a tudo o que viveram.

Boris Cyrulnik diz que o desenvolvimento da criança durante os seus primeiros mil dias depende do estado da sua mãe. Se a mãe sorriu durante o confinamento, a criança não terá absolutamente nada. Se a mãe está deprimida, se houve um luto na família, se a criança pertence a uma família violenta… a criança estará alterada. Por isso, é tão importante cuidarmos dos pais angustiados.

Na creche as crianças e as educadoras podem brincar com a água, jogar às escondidas, brincar ao CUCU de modo a que os mais pequenos entendam que o que desaparece sob uma máscara está sempre ali.

Claro que seria melhor para todos não haver máscaras, vírus, doenças, mortes, separações… cada um faz o que pode, não adianta julgar.

O importante é aprendermos a viver com a incerteza, a imprevisibilidade e a insegurança e acreditar que seremos capazes de sonhar outra vez.

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