Uma conversa com Carlos Antunes no Mosteiro, numa imensa mesa para pensar com um imenso ortofotomapa , que nos abre para um plano da cidade do tamanho do mundo. Uma história, um caminho e uma identidade de vanguarda, muitas lutas mas sobretudo “The beginning of a memory”. Palavras de um profundo impacto estético que intercetam com a literatura, a filosofia, a intervenção político-social, o urbanismo.
A Bienal de Arte Contemporânea nasce em 2015 no Círculo de Artes Plásticas de Coimbra (CAPC),um lugar singular que alterou o paradigma da arte em Portugal.
“Quase um milagre” em 1958, feito por estudantes que organizam um sítio para ensino de artes na cidade. Destacaram-se nomes como João Dixo, Angelo de Sousa , enquanto Alberto Carneiro e Ernesto de Sousa o ligaram às vanguardas europeias, seguidos por Túlia Saldanha, Pedro Croft, Julião Sarmento, Pedro Cabrita Reis e tantos outros artistas. Desde 2010, Carlos Antunes e Désirée Pedro, arquitetos, dirigem o CAPC e a equipa da Bienal, em co – organização com a Câmara e Universidade. Este Anozero19 com curadoria de Agnaldo Farias, professor da Universidade de S. Paulo e curador da bienal desta cidade em 2010, entre outras bienais.
Como pretexto, a primeira Bienal resgata a relevância do CAPC e a partir da nova condição da Universidade – Património Mundial da Humanidade, serve de ignição e de agente perturbador, evitando que o efeito Unesco transformasse Coimbra num parque temático, cristalizando a ideia de Património.
Pretende, assim, questionar o que a cidade não quer olhar , os nossos fantasmas, as nossas inquietações, as boas práticas e os limites do que se considera Património, convocando em simultâneo interrogações sobre outras realidades mundiais. E este é o seu propósito e desafio.
Para Carlos Antunes a arte contemporânea é um sismógrafo do que se passa no mundo, permitindo reconstruir a globalidade a partir de uma perspetiva individual. O seu lugar é sempre uma “Terceira Margem”, um lugar improvável, uma heterotopia no sentido que lhe atribui Foucault, uma ilha de múltiplas camadas de significação como no poema de Borges –“Que rio é este onde corre o Ganges?”. “Que rio é este onde corre o Mondego?”, poderíamos também perguntar.
Mas para que se entenda melhor o tema e o programa desta Bienal, o seu diretor sugere-nos a leitura do conto de Guimarães Rosa – “ A terceira margem do rio” ”, porque nos leva a refletir sobre a ausência, a impotência, a fragilidade, a maturidade, a morte. Entra aqui também a relação com a arquitetura enquanto disciplina de organização de espaços. Como dizia Fernando Távora – “uma estaca no deserto organiza o deserto “ e desta forma, a partir da Bienal podem surgir propostas para a cidade e para a polis. Num encantador edifício, não mais abandonado, cheio de cicatrizes e reativado com poucos recursos e muita energia – o Mosteiro de Stª Clara-a-Nova, e em vários outros pontos da cidade, inaugurou a 2 de Novembro e ficará até 30 de Dezembro.
Imagem: Moirika Reker Gilberto Reis – Arcos do Jardim, Coimbra
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